Erros Inatos do Metabolismo
EIM: São distúrbios geneticamente determinados, relacionados às funções bioquímicas do organismo.
Os erros do metabolismo se originam a partir de mutações que ocorrem aleatoriamente em genes responsáveis pela codificação de certas proteínas, as quais desempenham funções específicas nas vias metabólicas.
Em geral, essas proteínas são enzimas. Catalizam reações em cadeias de síntese ou renovação de substâncias e sequência de produção de energia. Em alguns casos há a utilização de metais que são proteínas com funções transportadoras de moléculas.
Devido à falha nessas enzimas, proteínas deixam de ser produzidas em quantidade adequada ou têm suas funções alteradas, o que prejudica o desenrolar natural.
As consequências para o organismo vão desde o acúmulo de substâncias incompletamente processadas, que se tornam tóxicas ou se depositam em tecidos vitais, a carência de produtos.
Hiperfenilalaninemia
É o acúmulo do aminoácido fenilalanina no organismo, elevando sua concentração no sangue e demais fluidos corpóreos.
Fenilalanina: Aminoácido de cadeia aromática, pertencente ao grupo dos nutricionalmente essenciais, já que não é produzido pelo organismo humano.
Sua maior parte é destinada à síntese de proteínas e substâncias diversas, incluindo a melanina e neurotransmissores. Uma certa porção ainda é destinada à produção de energia através do metabolismo intermediário.
É catalizada pela enzima fenilalanina-hidroxilase, que faz a hidroxilação de sua molécula com ajuda de um cofator, a tetrahidrobiopterina. Resulta no aminoácido tirosina, que continua a cadeia metabólica.
O defeito no processamento de fenilalanina pode estar relacionado à carência da enzima ou do cofator. A segunda opção é mais rara.
A hiperfenilalaninemia por deficiência da fenilalanina-hidroxilase são classificadas segunda a concentração de fenilalanina no sangue que reflete o nível de atividade enzimática.
Quando a atividade da enzima é só até 3% e a concentração de fenilalanina é acima de 10 mg por 100 ml de plasma é chamada de Fenilcetonúria.
Fenilcetonúria
A fenilcetonúria por deficiência de fenilalanina-hidroxilase se caracteriza por níveis elevados de fenilalanina no plasma, superiores a 10mg/100ml.Esse EIM é resultado de mutações no gene relativo a esta enzima, localizado no cromossomo 12. Segue um padrão de herança autossômica (nos cromossomos que não definem o sexo, podendo ocorrer tanto em homens como mulheres) recessiva.
Em cada gestação, os filhos de um casal heterozigoto terão 25% de chance de nascerem homozigotos afetados, 50% heterozigoto assintomáticos e 25% de chance de nascerem homozigotos normais.
* Incidência: A Fenilcetonúria por deficiência da enzima fenilalanina-hidroxilase é abrangente em todas as regiões e grupos étnicos. É em média 1:15.000 nascimentos vivos no mundo. Variando o número em certos países, como o Japão, onde a incidência é dez vezes menor.
* Fisiopatologia: Não ocorrendo um processo normal da fenilalanina em tirosina, a concentração de fenilalanina se eleva no sangue, tendo um correspondente aumento na excreção urinária.
Em geral, as necessidades diárias de tirosina são supridas pelas fontes de alimento.
Mas a fenilalanina em excesso pode ser desviada para uma rota metabólica alternativa onde metabólitos secundários, como os ácidos fenilpirúvico, feniláctico e fenilacético, são produzidos.
O ácido fenilacético confere à urina um odor desagradável.
A alta concentração repercute no sistema nervoso central, afetando o desenvolvimento cognitivo e outras funções neurológicas. A formação de mielina decresce, assim como de dopamina, serotonina e norepinefrina (noradrenalina). Em exames de imagem por ressonância magnética é possível observar áreas de desmielinização da substância branca profunda peri-ventricular em toda a extensão do encéfalo, com predomínio nas regiões frontais e temporais.
Os mecanismos que levam a Fenilcetonúria afetar o sistema nervoso não se encontram precisamente esclarecidos. Supõe-se que a fenilalanina em excesso, compete com outros aminoácidos essenciais pelo transporte através da barreira hemato-encefálica, fazendo diminuir o aporte destes aminoácidos para o tecido cerebral. São prejudicados principalmente o transporte de aminoácidos de cadeia ramificada, como o triptofano e a tirosina, necessários para o desempenho do sistema nervoso e síntese de sistemas nervosos.
* Quadro Clínico: Ao nascimento o paciente aparenta ser saudável e sem disformias somáticas. Permanecem assintomáticos nos primeiros meses de vida, até se tornarem perceptíveis os primeiros sinais de atraso no desenvolvimento neuropsicomotor.
Sem tratamento: evoluem para deficiência mental, muitas vezes em grau acentuado. A aquisição da linguagem costuma ser muito precária e alguns apresentam microcefalia.
Podem apresentar hiperatividade e comportamento semelhante ao autismo. Não costumam ser agressivas.
Alguns apresentam crises epiléticas, de tipos variados. Crises de espasmos com hipsarritmia associada (Sindrome de West) que podem ocorre no período lactente. Mais tardiamente a alterações psíquicas, como depressão, ansiedade e fobias.
Em aproximadamente 10% o deficit cognitivo é leve e o paciente pode passar desapercebido se não for investigado. Apresenta dificuldade para o aprendizado.
* Diagnóstico: Existem dois momentos para o diagnóstico, no período neonatal, quando o paciente não apresenta manifestações clínicas, ou tardiamente, já estando estabelecida a deficiência mental, lesões orgânicas irreversíveis.
Por isso a triagem neonatal foi implantada há cerca de 40 anos, visando detectar rapidamente as crianças afetadas, essa triagem também incorpora inúmeras outras patologias como alvo de pesquisas.
É feita a constatação pelo aumento persistente da concentração de fenilalanina no sangue, sem alteração da taxa de tirosina e sem evidências de alteração do cofator, tetrahidrobiopterina.
Nos recém-nascidos as amostras de sangue são retiradas por punção do calcanhar, mais simples que punção venosa, ficando o exame conhecido popularmente como "teste do pezinho".
* Tratamento: Baseia-se na restrição alimentar do elemento não metabolizado adequadamente pelo organismo, o que implica numa dieta limitada em proteína natural, fonte do aminoácido fenilalanina.
Esta abordagem foi iniciada pelo pediatra alemão H. Bickel em 1953. Hoje ainda é o recurso terapêutico para a doença.
É necessário que o tratamento dietético seja iniciado no primeiro mês de vida, antes que o sistema nervoso seja irreversivelmente acometido. Os pacientes tratados precocemente atingem o desenvolvimento intelectual plenamente satisfatório. No entanto, o tratamento é recomendado para qualquer que seja o momento do diagnóstico, a fim de minimizar a progressão contínua da doença.
São suplementados por uma fonte proteica alternativa, que é isenta de fenilalanina. Onde possuem aminoácidos manipulados artificialmente e são apresentados em forma de pó, que após reconstituição em água, adquirem aparência de leite. Atualmente, são importadas, sendo disponibilizadas aos pacientes através do Programa Nacional de Triagem Neonatal, do Ministério da Saúde.
Hiperfenilalaninemia Benigna
Os casos com atividade enzimática superior a 3% e a taxa plasmática de fenilalanina entre 4 e 10 mg/100ml são designados como Hiperfenilalaninemia Benigna.
Uma forma transitória de Hiperfenilalaninemia Benigna ocorre em lactentes (crianças até 2 anos de idade), supostamente por mecanismo de imaturidade metabólica, que costuma se normalizar sem necessidade de tratamento e sem deixar sequelas. Alguns ainda podem permanecer indefinidamente com níveis aumentados até 10mg/100ml, sendo assintomáticos.